Antes de mais, vou esclarecer: eu acredito no possível poder de mudar as coisas de um festival como o Live Earth. É claro que move muito dinheiro, é claro que a mera organização de um concerto é de algum modo poluente, é claro que há (muitas) bandas que só alinham nisto para se promoverem. Mas eu acredito que um Live Earth pode fazer mais do que um Live Aid. Por um motivo muito simples: é uma maneira prática de mostrar a milhões de pessoas as pequenas coisas que elas podem começar a fazer já. A maioria da poluição tem causas industriais e não pessoais? Bem sei, mas isso não pode servir como desculpa de mau pagador para continuarmos na nossa vidinha como se não tivéssemos nada a ver com o assunto. A moral do Live Earth é simplesmente: “Curtam lá o Kanye West ou os Foo Fighters, desde que se lembrem de trocar a merda das lâmpadas quando chegarem a casa”. E isso já me parece qualquer coisa.
Uma maratona como o Live Earth é muito cansativa, apesar de nunca ter pontos mortos. Mas para o meu grau de cansaço só pode ter contribuído o facto do alinhamento de Nova Iorque não me dizer grande coisa. Enquanto Londres teve Madonna, Foo Fighters, Red Hot Chilli Pepers, Beastie Boys, Metallica ou o delicioso regresso dos míticos Spinal Tap, eu tive de gramar com uma dose de bimbice a dar para o country e de hip hop chapa-quatro. A experiência valeu a pena: eu não vi na televisão como toda a gente, estive mesmo lá. Histórico. Giro. E tal. Mas pronto, talvez não seja para repetir.
Uma coisa que os canais de televisão não mostraram – a RTP parece que não mostrou muito mais do que uma repórter aos pulos e o Aldo Lima a falar de ecopontos – foi que vários aviões com mensagens anti-Gore estiveram a sobrevoar o estádio dos Giants. Pareciam aquelas avionetas que sobrevoavam as praias de Cabanas de Tavira quando eu era miúda, mas em vez de “venha à feira de enchidos do Pagapouco” podiam ler-se coisas como “Don´t believe Al Gore: Demand Debate.Com”.
O palco era todo ele coberto com pneus coloridos. No meio havia uma estrutura giratória que fazia com que a música não parasse: o palco rodava e do outro lado estava uma banda já pronta a tocar. Era fofo se no Sudoeste também fizessem isso.
Quando entrou em palco o Leonardo DiCaprio houve berros e guincharia (chiça, até eu que não gosto do rapaz soltei um “ai, jazus!” quando o vi ali tão perto). E depois ele apresentou o Al Gore. E a gritaria (incluindo a feminina) foi ainda maior. Nunca esperei ver o dia que o o Senhor Gore seria um símbolo sexual. Yuck…
Entre bandas ainda havia algum tempo para ver vídeos com mensagens ecológicas. Aquele que foi provavelmente mais eficaz (corri o Youtube todo mas não o encontrei) consistia basicamente em três minutos de close up do rabo de vacas a defecar. Sim, espessos e portentosos pedaços de caca em vários tons de verde a sair em câmara lenta da respectiva “toca”. A mensagem era simples: o gás produzido pelas fezes dos animais para abate é uma das principais fontes de gases na atmosfera. Se cada pessoa abdicar de comer carne uma vez por semana, os gases diminuem dez por cento. That simple.
Descobri, por estar a trocar sms com várias pessoas de Portugal (doeu muito no roaming) que os concertos que aí se viam na TV estavam longe de ser em directo. A diferença era quase de duas horas. Ao ponto da
Anne Martens me mandar um SMS a dizer: “Agora estou a ver o James Blunt em Londres. Ou então é um primo dele nas festas da Chamusca. Já não acredito na RTP”.
Ir a um concerto de estádio nos US of A fez-me perceber que se calhar quando as bandas vão a Portugal e dizem que somos um público maravilhoso estão mesmo a falar a sério. O público americano basicamente: 1) guincha quando o artista entra em palco como se quisessem chegar a decibéis que só os cães ouvem; 2) sentam-se no lugar (TODOS os lugares são sentados e marcados, até a relva, que era onde eu estava) e quase não dançam, pulam ou cantam; 3) guincham mais um bocado quando os artistas acabam. Pelo meio comem uns hot dogs e umas coisas.
De resto:
- A Melissa Etheridge tocou durante VINTE minutos a mesma música! Pelo meio falou pelos cotovelos. Começou por ser comovente, mas depois parecia mesmo que a qualquer momento ela ia começar a partilhar com o mundo a sua lista das compras ou uma receita de Pão de Ló. Foi um discurso extremamente político e de crítica aberta ao Bush, algo que mais ninguém fez.
- Zach Braff, Zach Braff, Zach Braff (não me lembro o que é que ele disse em palco, mas não interessa)
- o John Mayer é fofo!
- o Kanye West continua a ser o maior (até para mim que não ligo a muito a hip hop)
- a
Jane Godall esteve em palco a imitar chamamentos de ajuda dos gorilas. Senti alguma vergonha alheia.
- os Bon Jovi foram a festa das festas. Eles tocaram o meu guilty pleasure “Livin’ On A Prayer”, por isso até se esteve bem (e descobri que NUNCA se deve dizer a um americano que não se gosta de Bon Jovi)
- os Smashing Pumpkis estavam lá claramente para promover o novo disco…. Cada vez mais acho que, infelizmente, o Billy está em vias de desenvolver um sindroma Axel Rose.
- O Roger Waters foi bem melhor do que eu estava à espera, incluiu coro de criancinhas de um bairro de New Jersey e um porco gigante insuflável que dizia “SOS: Save Our Saussage”.
- Ver os Police foi bem catita, apesar do Sting em algumas (breves!) partes ter desafinado ao ponto de parecer a minha gata Pimenta quando quer saltar para cima do gato da varanda vizinha e fazer-lhe um filho (eu sei que é ao contrário, mas a coitadinha é virgem e não sabe estas coisas). A reter: o baixista tinha uma correia no baixo com o Kenny do South Park cheio de sangue. O vídeo que tinha no post debaixo (e que já tiraram) era do momento final, o “Message In A Bottle”, ao qual de juntaram o Kanye e o John Mayer.
Num dos concertos, um jovem bêbado farto de aturar os AFI gritava para o palco “chiça, preferia estar em casa a trocar as lâmpadas”. Espero que quando o efeito do álcool passou ele as tenha trocado mesmo.