Daqui a dez anos ...

A cara cheia de bolo não esconde aquilo que é: um reguila nato. Quando crescer, ele vai ter cabelo louro, olhos cor de avelã e um charme que já lhe é inato. Imagino-o aos 14 anos com as raparigas da turma a fazer testes de cruzamento do nome dele com os delas para saber se são compatíveis. As raparigas das outras turmas vão tentar escrever-lhe recados nas mesas das salas que partilham nos vários pavilhões de uma qualquer escola pública. Eles vão querer te-lo como amigo porque sabe jogar à bola. É sexta feira e ele tem a tarde livre. A rapariga mais gira da escola ganha coragem e pergunta-lhe se quer ir comer um gelado... Ele aceita mas esquece-se e fica duas horas no ringue a jogar à bola. Ela espera e ele lembra-se de ir ter à gelataria, de calças sujas, esbaforido e a pele queimada do sol. A colega espera e ele justifica-se com a verdade. A menina esboça um sorriso e pensa “ele veio”. O gelado dela é de morango, ele escolhe o de chocolate.

Anos mais tarde, a faculdade. Estou a vê-lo de t-shirt branca a entrar pelo portão. Casaco amarrado à cintura, caderno dobrado no bolso, caneta na mão e a olhar para o relógio. Está atrasado. Doutoras e caloiras suspiram por ele. Apontamentos? Não é preciso. As colegas fotocopiam tudo e convidam-no para estudar com elas. Há sempre desculpa e nenhuma tem uma razão particular para o safar porque ele é de facto especial, muito especial... é como ele vai ser.